"Liberdade não é a ausencia de compromissos, mas a capacidade de escolher sua tarefa"

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Polêmica BBB 14

O que o BBB 14 já disse sobre você

"Participante da nova edição do Big Brother Brasil trabalhou como camgirl - e a internet, enfurecida, já a julgou e condenou 

Nádia Lapa, CartaCapital / Feminismo pra quê

Segunda-feira (6) entrei na internet e ela estava toda feminista. Perdi as contas de quantas pessoas compartilharam o texto "Xingamento", assinado por Gregorio Duvivier e publicado na Folha de S.Paulo. Nele, Duvivier fala sobre quão errado é utilizarmos adjetivos de cunho sexual como agressão. Usou exemplos voltados às mulheres e aos homens - apontando, com razão, que mesmo quando os homens são o alvo da chacota, é a mulher que se relaciona com ele (mulher, parceira) quem leva a pedrada.

Por mais restrições que eu tenha ao texto (e tenho várias), foi curioso ver as timelines do Facebook e Twitter cheias de links para uma coluna que exemplifica um termo muito usado no feminismo, o slut shaming. Fazendo uma tradução bem pobre, slut shaming significa "chamar de puta". Na verdade, ela engloba algo muito maior: representa o julgamento moral do caráter de uma mulher baseando-se na vida sexual dela. A vida de verdade ou a que o agressor inventa. Ao exclamar "vadia!", a pessoa não está falando que tal mulher tem vida sexual reprovável (como se fosse possível medir ou passar a régua no que é certo ou errado na cama); a mulher vira todareprovável.

Uma vadia, assim vista socialmente, está vários degraus abaixo da linha de ser humano. De repente ela não serve para ser mãe, profissional, colega de faculdade, nada. Ela se resume à agressão, ao nome que lhe imputaram, e tem culpa de tudo de ruim que porventura lhe acontecer. Isso é o slut shaming, prática que todas as feministas combatem. Nós já escrevemos textos e mais textos a respeito; nos encontramos para discutir o assunto; marchamos uma vez por ano pelas ruas.

Ainda assim, foi preciso um homem vir dizer que fazer isso é errado. Pensei que tinham escutado e que - ah! prazer dos prazeres - pelo menos essa parte da militância nós já poderíamos deixar de lado. "Todos agora entenderam quão errado, agressivo e destrutivo o slut shaming é, e ninguém mais vai usar de palavras tão baixas para se referir a uma mulher; tampouco irão diminuí-la em razão de qualquer coisa que ela tenha feito - ou deixado de fazer - em sua vida sexual", imaginei, aqui, no meu conto de fadas. Que amor tanta gente descobrindo o feminismo!

De um dia pro outro, literalmente, as coisas mudaram totalmente de figura. Saiu a lista dos participantes da nova edição do Big Brother Brasil e, entre os escolhidos, há uma garota que trabalhou como camgirl.Camgirls são mulheres que fazem aparições eróticas via webcam, enquanto a pessoa do outro lado da tela paga por minuto para assisti-las.

Vasculharam a vida online da participante, compartilharam vídeos da mesma, e os xingamentos se multiplicaram. Na mesma internet que na véspera um texto quasefeminista (mil aspas, por favor) foi profusamente compartilhado, agora o slut shaming corria solto. O programa ainda nem começou, mas já sabemos qual é a vadia da vez.

Dormi com a internet feminista, acordei com a misógina. Fica difícil entender, afinal, qual é a das pessoas, onde elas querem chegar, o que realmente lhes toca. É a discussão levantada pelo texto ou é a malhação da moça que usou o próprio corpo, e tão somente o próprio corpo, para uma prática absolutamente legal?

Quem somos?

Vamos decidir? Somos pessoas boas, bacanas, e que não se importam com a vida sexual alheia? Ou somos babacas, cretinos e machistas de plantão, apenas à espera do surgimento da próxima safada, quando nos uniremos em manada com outros imbecis e a xingaremos e a trataremos pior do que lixo?

Em breve você poderá ver a vida da moça com um clique no controle remoto. Mas a sua, dependendo da reação, já está exposta.

Afinal: de que lado você está?"

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